Dublado ou Legendado? O eterno dilema


Você já deve ter passado pela seguinte situação: a galera marca de ir ao cinema, e após muito debate, vocês finalmente chegam a um consenso sobre o que vão assistir. Porém, tem um detalhe: só tem uma sessão no horário que vocês querem, e o filme é DUBLADO.


Bem, se algo parecido aconteceu no seu grupo de amigos e vocês conseguiram chegar a um acordo, parabéns! Convencer alguém que não curte dublagem a assistir algo na nossa língua não é tarefa fácil. Há também aqueles que detestam acompanhar as legendas.

Vamos tentar entender um pouco do ponto de vista dos dois lados?


O famoso "áudio original"

O argumento mais usado pelos defensores das legendas: muito se perde na adaptação. E isso é pura verdade. Muitas piadas dos gringos não fazem o menor sentido e não tem a mínima graça na nossa língua. Já ouviu alguma piada de TOC TOC?

Séries de comédia normalmente adaptam suas piadas para o público brasileiro

E o mesmíssimo argumento pode ser usado pra defender a dublagem. Afinal, se a piada não faz sentido pra mim, e a intenção é dar risada, por que assistir legendado? O problema é que, em muitos casos, o diálogo é totalmente modificado. Se faz referência a um programa da TV norte-americana, por exemplo, na tradução pode citar o Domingão do Faustão.
Talvez nos filmes e séries de comédia, realmente as falas originais façam mais sentido pra quem assiste. Mas isso só se aplica a quem domina a língua estrangeira.

A situação se complica em outros casos, como o dos musicais. Frozen, animação de 2013 da Disney, é um ótimo exemplo. Traduzir uma música não é tão simples quanto um diálogo. A melodia deve se manter intacta e a letra ainda precisa manter a mesma idéia. O tema principal do filme, Let it Go, foi adaptado como 'Livre Estou' no Brasil, facilitando assim o entendimento da criançada e deixando muitas mães por aí de cabelo em pé, pois os filhos simplesmente não paravam de cantar. Apesar da expressão "let it go" significar "deixa pra lá", diferente de como foi traduzida, a adaptação conseguiu fazer com que a canção continuasse bela e ainda fizesse sentido no contexto da história.


Nossa dublagem é uma das melhores do mundo

Gostando ou não de animês, é impossível que você nunca tenha ouvido falar de Dragon Ball. Pois bem, sem entrar em muitos detalhes: é um dos animês mais famosos do nosso país e a dublagem é um fator importantíssimo que contribuiu para tal. E um detalhe interessante é que a adaptação brasileira consegue superar de longe todas as outras, talvez até o trabalho original japonês.

Masako Nozawa, a voz original (Seiyuu) de Son Goku

No Japão, é normal que personagens infantis sejam dublados por mulheres para que o tom de voz ideal seja atingido. O problema no caso do Goku é o seguinte: ele cresceu, já é um pai de família e tem até mesmo uma neta, portanto não faz sentido que a voz dele continue sendo a de uma criança. Mas é isso que acontece no trabalho original: a atriz que dá vida ao Saiyajin, uma senhorinha chamada Masako Nozawa, faz esse trabalho desde a primeira temporada do animê (1986). Então o personagem envelheceu, mas a impressão que dá é a de que ele teve algum problema hormonal e sua voz não engrossou.

Agora falando do incrível trabalho de adaptação que Dragon Ball recebeu no Brasil, temos dois irmãos super talentosos que fizeram com que Son Goku, o famoso Kakarotto, fosse tão amado por aqui. Úrsula Bezerra, também conhecida por ser a voz de Naruto, cuidou da dublagem do pequeno kid Goku na primeira saga de Dragon Ball (esta que é simplesmente ignorada pela maioria dos fãs de Dragon Ball Z, mas essa discussão fica pra uma outra hora). Então, assim que o guerreiro atingiu a maturidade, o responsável pelo trabalho passou a ser o irmão de Úrsula: Wendel Bezerra.
Se você mora no Brasil e não se isola da sociedade numa caverna, é bem provável que já tenha ouvido a voz deste que é um dos dubladores mais famosos do país. Wendel também fez outros personagens que se popularizaram, como Bob Esponja e Edward Cullen, protagonista da saga Crepúsculo. Mas certamente sua frase mais famosa e amada pelos fãs é: "Oi, eu sou o Goku!"

Na versão dublada, Goku tem uma voz que corresponde com a sua idade

É claro que existe uma grande diferença entre a língua japonesa e a inglesa. Os japoneses nem mesmo utilizam o nosso alfabeto, o que torna o entendimento da língua muito mais complicado para nós. Portanto, voltemos ao foco do texto, que é a linguagem norte-americana.


"Se tá no Brasil, tem que ser em Português!"

Será mesmo?
Quando você entra na seção feminina de uma loja de roupas, o que você vê? Shorts, body, top, jeans skinny, meia-calça legging na cor nude...
Seu smartphone tem apps que você baixou (fez download) na Play Store... a não ser que seja um iPhone, da Apple. Na sua casa há um freezer onde você coloca os Nuggets que vai comer mais tarde, quando estiver jogando Video Game ou assistindo Netflix.

Perceba que estamos rodeados de palavras em Inglês o tempo todo e em todos os lugares. Elas estão tão incorporadas em nosso vocabulário que somos bilíngues sem nem perceber.
Não é obrigatório conhecer a língua, mas é inegável a importância dela nas nossas vidas, até nas coisas mais simples.

Eu sou de uma geração que era obrigada a jogar Video Game com um dicionário do lado. E apesar de ter sido uma situação sofrível na época, hoje sou grato por ter aprendido outra língua de uma forma divertida. Hoje, praticamente todos os jogos são dublados, o que é uma faca de dois gumes: facilita o entendimento, mas perde-se a oportunidade de aprendizado.

O trabalho de adaptação nos Games muitas vezes supera até mesmo o das produções cinematográficas

Recusar-se a jogar um Game pelo simples fato de ser em Inglês não é apenas uma atitude preguiçosa, mas demonstra também a falta de entendimento sobre a importância da língua num mundo globalizado. De novo: ninguém é obrigado a falar Inglês. Mas nenhuma desenvolvedora é obrigada a traduzir seus jogos também, concorda!?

Obviamente não há nada errado em exigir uma adaptação para o mercado nacional, que é um dos maiores do mundo. Empresas como Ubisoft, Warner e Bandai Namco já enxergam a importância do Brasil na indústria dos games e trazem todos os seus jogos traduzidos. Mas outras, principalmente as japonesas, ainda não o fazem. E quando lembram de nós, colocam NO MÁXIMO uma legenda. Sim, Square Enix, eu tô falando de você.

Portanto, não dá pra depender 100% da "boa vontade" das devs. Se você quer aproveitar todo o catálogo de games disponível no seu console ou PC, é obrigatório o entendimento da língua inglesa.


Inclusão e acessibilidade

Filmes, músicas e jogos são uma forma simples e divertida de se aprender uma outra língua. Saber ou não saber falar Inglês é uma questão de força de vontade. Não generalizando, é claro, pois sabemos que muitos brasileiros só tem acesso à educação básica, ou nem isso.

Mas quando se toca nesse assunto, muitos se esquecem dos deficientes auditivos e visuais. Na verdade, deixa eu riscar esse termo politicamente correto. Pronto. Vou chamá-los da forma que eles preferem ser chamados.

Além da dublagem propriamente dita, a audiodescrição é essencial para as pessoas cegas. Os canais abertos da TV brasileira são obrigados, desde 2011, a permitir a função na sua programação. Mas do que se trata o recurso? Nada mais é que a tradução de uma imagem em palavras. Muito parecido com um narrador contando uma história. Veja o exemplo abaixo:

Cebolinha foge da Mônica enquanto segura o Sansão pelas orelhas

Temos também a velha conhecida de muitos que costumam futucar nas funções do controle remoto: Closed Captions (CC). Esta é basicamente o oposto da audiodescrição: todo o áudio é transformado em texto, possibilitando que pessoas surdas ou com problemas auditivos possam entender aquilo que é falado. A TV aberta também tem a obrigação de suportar esta função.

Ou seja, dependendo das necessidades de cada pessoa, podemos definir qual é a melhor opção: texto ou áudio traduzido. E essa é a mágica da inclusão: poder escolher aquilo que se adapta melhor a você. O que devemos lembrar sempre é o seguinte: não é porque eu só assisto filme legendado que a dublagem deve acabar. Quanto mais opções existirem, melhor. Todo mundo deve ter a oportunidade de experimentar as mesmas histórias.