
Esse dias uma postagem no twitter me deixou pensativa sobre muitas coisas. Uma foto de uma estante onde livros YA (young adults, ou jovens adultos aqui no Brasil) eram vistos e se sentia o orgulho que a dona daquela estante tinha por isso. Porém, algumas pessoas, conhecidas oficialmente como "fiscais de leitura" foram até a postagem e disseram que literatura não era aquilo, que o que ela lê não a faz leitora.
Ao ver esse tipo de coisa minha mão coçou. Eu sempre amei livros, mas minha paixão começou aos 13 lendo "Crepúsculo" e a partir daí eu não parei mais. Passei por vampiros, fantasmas, romances, terror, suspense, clássicos, livros de pintar, autoajuda, anti-estresse, novos, velhos, de sebo, importados, em outras línguas. E a partir de tudo isso surgiu a minha pós graduação em Docência em Literatura e Língua Inglesa.
E dentro do que eu tenho lido e vivido na minha vida, e junto com a pós, entendi que literatura é bem mais que tudo isso.
Livros são sempre bem mais do que a gente acredita que eles são. Não são só páginas com letras, são mundos diferentes e irreais, são personificações de amores e de medos, são tudo aquilo que a gente quer ou não. Mas tudo isso só funciona quando se abre eles. Então o primeiro ponto que eu abordo aqui é: se você julga um livro pela capa, por ter uma princesa, por ter um homem sem camisa, ou porque o nome não te diz nada do que você procura, você peca ao achar que a literatura te dará as coisas de mão beijada. Livros são para serem lidos, digeridos e eles criam um significado em cada um dos seus leitores. Que nunca será o mesmo. Sabe quando você fica bravo com uma adaptação porque o personagem não era aquele? Então, porque cada um vê e interpreta de uma forma.
A segunda coisa que eu quero abordar aqui: como você julga o que deve ser lido? O gosto por leitura para mim começou com "Crepúsculo", mas não é minha saga favorita de vampiros - nesse quesito P.C. Cast e Anne Rice estão pau a pau - mas a partir dele eu conheci as irmãs Brönte, e depois Jane Austin, e por ser vampiros, parti pra Drácula, e depois Frankenstein, chegando em Poe e Lovecraft. Por ser sobre um amor impossível, fui a Shakespeare, hoje fico em Dante. Então, meu querido fiscal, só porque você não gosta da temática, não gosta do livro ou não gosta porque sei lá, você não quer gostar, não quer dizer que não vai levar alguém a ler um clássico, que é considerado por você apenas a "literatura relevante". Que me leva a um tópico importante!
Nossos livros considerados importantes (o termo correto é canônico, já que eles são considerados livros sem precedentes para o leitor) são todos pautados em livros europeus, de tempos diferentes e que para nós tem mais cunho histórico e acadêmico do que realmente uma história diferente de tudo. Claro que eles são base pra muita coisa, mas não são únicos.
Nossos livros considerados importantes (o termo correto é canônico, já que eles são considerados livros sem precedentes para o leitor) são todos pautados em livros europeus, de tempos diferentes e que para nós tem mais cunho histórico e acadêmico do que realmente uma história diferente de tudo. Claro que eles são base pra muita coisa, mas não são únicos.
Aqui chego ao terceiro tópico: livros canônicos deram a base para nossa literatura de hoje. Desde terror ao romance meloso, tudo isso já existe há anos e eu não preciso ler um livro de 1300 pra saber ou sentir isso (lembrando que eu posso, se eu quiser, mas tem livros que passam a mesma ideia desse século, ou que saíram até esse ano).
"Ah, Gabs, eu entendo tudo isso, mas você entende que tem livros que não são bons? Tem textos que são ruins. Tem um artigo.." Eu entendo tudo isso. Até porque tem textos antigos que são horríveis e problemáticos (não gosto de "Romeu e Julieta" por exemplo, por ser uma relacionamento entre pessoas de idades muito distintas e bem tóxico pois leva ao suicídio, mas até aí temos isso hoje e na época que foi escrito era mais pra dizer sobre hipocrisia das famílias da época e como as vidas eram complicadas) e também tem coisas que não fazem você se apaixonar e gostar disso. Claro, você pode me citar vários autores e eu também posso te citar teóricos. Mas eu trabalho com a linha simples e fácil: a gente pode ler de tudo. Um best seller, um clássico, um YA, uma HQ, um suspense, uma distopia, um sci-fi.
O que eu discuto sempre é: literatura é totalmente subjetiva. É uma vertente de várias artes onde cara um tira dela o que sente, o que toca, o que procura, o que quer viver. Livros trazem experiências e expectativas que a gente talvez nunca tenha e nunca passe, mas que precisa vivenciar ou precisar ver numa outra perspectiva para entender a mente ou a situação.
Os livros contam histórias. As pessoas se identificam com elas ou não. Assim como na vida. Se você parar de verdade para olhar, cada um de nós somos uma história. E tem algumas que nos chamam atenção, que queremos parte da nossa, como há histórias que não queremos, não gostamos, nos arrependemos de fazer parte. Livros são assim.
O que eu quero dizer é que tudo é literatura. A qualidade é questão de opinião. O que eu quero é que cada pessoa entenda e perceba que num país onde o consumo de livros é minúsculo, quando se vê alguém lendo, deve-se aplaudir e incentivar. Tem que se deixar as portas abertas. E se a pessoa lê algo e você quer que ela leia um clássico, faça algo simples: indique. Diga, olha tem esse livro que você pode gostar porque você leu tal coisa.
As pessoas precisam respeitar os gostos uma das outras. Opinar sim, mas não dizer que isso te faz mais ou menos conhecedor. Eu nunca gosto de dizer sobre a minha formação ou o que eu estudo e gosto de fazer, mas há momentos que usar seu "diploma" , ainda mais sendo mulher, muda a forma como vão te tratar e até como vão falar com você.
Opiniões a parte, o que é Literatura é uma discussão de séculos, que gera intrigas no próprio meio e faz com que milhares de pensadores tentem dizer o que ela pode ser. Mas a função principal é fazer você ver o mundo em diversas perspectivas, mergulhar em lugares novos e diferentes e se descobrir ou não.
Cabe a nós respeitar, interagir e acima de tudo entender que não adianta ficar fiscalizando a leitura alheia. Cada um se sente confortável com o que quer ler, cabe a você entender e se possível, conhecer.