The Mandalorian - Tudo que Star Wars precisava


Quem me conhece, sabe o quanto gosto da franquia Star Wars. Seja falando de animações como Clone Wars e Rebels, HQs (após a compra da Disney, não-canônicas) que abordam o universo expandido da saga (como é o caso de Legends), ou até mesmo da Saga Skywalker nas telonas. Entretanto, o declínio técnico da série (ênfase nos games e filmes) nos últimos 21 anos é evidente. 

Saga Skywalker: simbólica, mas como um todo medíocre.

As “prequels” (episódios I, II e III) tiveram grande expectativa e muito dela serviu como proteção para os pontos negativos da saudosa trilogia escrita e dirigida pelo criador de Guerras nas Estrelas, George Lucas. E as “sequels” (episódios VII, VIII e IX) já são mais 8 ou 80: ora amam, ora odeiam. Mas no fim, a Saga Skywalker mostra-se simbólica, mas como um tudo pra lá de medíocre.

Uma visão ampla da Saga Skywalker.

Fora dos filmes, com exceção das animações, a saga também produziu muito mais materiais ao menos duvidosos, como os games da era EA, entre outros jogos pra lá de péssimos (sim, Kinect Star Wars, estou falando com você).

Entre um dos produtos “duvidosos” da saga, temos o clássico especial de fim de ano protagonizado pelos personagens da trilogia clássica: o Holiday Special, de 1978. Este especial renegado por George Lucas (com teorias até de que o escritor americano teria comprado cópias de VHS do especial para destruí-las) e pela própria Disney foi por muitos anos conhecido como uma alucinação coletiva, mas essa “alucinação” durou apenas até a ascensão do marco civil da internet, quando cópias desta pérola foram replicadas sites afora e hoje a obra é facilmente encontrada no YouTube (legendada, inclusive).

Holiday Special traumatizou uma geração de fãs da guerra galáctica no que se diz ao formato televisivo, o que fez nós jamais vermos nada em live-action com duração de 20 minutos por mais ou menos 4 décadas.
Com uma bagagem de 42 anos, a saga Star Wars finalmente vem com uma série de TV, em um formato de 8 episódios e falando sobre uma das facetas da enorme galáxia fictícia, que eu diria que não poderia vir em melhor estilo. Com uma introdução de 6 parágrafos, acho que posso dizer que o background para ao menos simpatizar com a série é explícito. Por isso, vamos lá:

 

Esta análise vai tentar ser feita sem spoilers (diga-se sem spoilers como uma análise mais abstrata e com uma abordagem mais direta somente com o que foi apresentado em trailers), já antecipo isso. Portanto, se terá ou não, depende se a primeira frase deste texto lhe atesta de algum eventual spoiler ou não. Mandalorian é uma série indiscutivelmente bem recebida, mesmo que com algumas ressalvas por parte de críticos. Mas no geral, é aquele tipo de produto tão, mas tão bom que é até difícil de achar algum ponto negativo, diferente de tudo que Star Wars já teve antes, que até nas melhores obras da saga.

A restituição da República Galáctica não foi uma grande festa para todo mundo.

Eu acho que a primeira rasgagem de seda para Mandalorian vai para a ambientação. A série se passa entre os episódios VI (Retorno de Jedi) e VII (O Despertar da Força), com a queda do antigo império e a restituição da República Galáctica. Mas diferentemente daquela celebração de Retorno de Jedi, aqui nós vemos uma das visões sobre estes acontecimentos nesta galáxia fictícia: a nova República é uma completa bagunça, a galáxia volta ao cenário faroeste da Velha República e a negociação não-diplomática com o Império apenas torna ele um movimento ramificado, ainda mais violento e reacionário, virando uma verdadeira facção em alguns dos casos. Aqui vemos que alguns elementos de Indiana Jones, outra franquia de George Lucas, o criador do que originou essa série como um derivado, foram emprestados no que se diz em ambientação.

Mas claro, além do velho-oeste, Mandalorian apresenta muitos elementos de obras asiáticas, como o colapso da ordem e a honra pra lá de determinada por parte do guerreiro, algo bem marcado em obras de samurai, mas também em Mandalorian. E ter essa quebra de imagem de que o bem venceu o mal, de que a ordem foi restituída que temos em Return of Jedi, ver que aquela reviravolta na verdade deixou a galáxia mais caótica, mais bagunçada, ver que dentro do universo de uma galáxia muito, muito distante há um lugar onde filosofias da força não importam, ver um planeta onde os jedi ou os sith são uma ideia distante, tudo isso seduz um pouco o espectador, talvez já cansado de batalhas de sabre de luz ou morte de imperadores.



O mandaloriano possui seus próprios dilemas, suas próprias honras, seus próprios problemas, que podem (e são) em grande parte mais simples que os dilemas da família Skywalker. Mas essa aparente simplicidade não exclui momentos de tensão e muita ação da forma mais épica, como toda obra Star Wars. A série reforça essa “decadência” do Império com uma estética muito mais suja carregada à uma das ramificações da divisão política do lado negro da força.

Mas vamos falar de história? The Mandalorian conta a vida de (pasmem) um mandaloriano, mais especificamente o mandaloriano Din Djarin, ou “Mando”, que é também caçador de recompensas. Acompanhamos suas aventuras percorrendo a galáxia em 8 episódios, conhecendo também novos companheiros à jornada de Mando.

Por Mando ser um caçador, tudo ali ocorrido é baseado em ciclos, que tem um início, meio e fim. Esses ciclos (as caçadas) fecham muito bem com um formato de séries, que possuem uma duração boa o suficiente para explorar as caçadas por completo, o que torna o ritmo da série excelente. E claro, esse formato evita também lidar com quebras de ritmo, algo muito recorrente nos filmes de Star Wars, por exemplo. Para evitar spoilers, me limito a dizer que apesar dos ciclos, há uma construção de relação de Mando com outro personagem que se estende até o final da primeira temporada, personagem esse que é de suma importância para a construção de personagem do próprio, mas também de Mando.

Falando em personagens, vamos falar da construção deles em The Mandalorian. E em resumo: pau a pau com a trilogia clássica de Star Wars em carisma, diria que até superior em comparação com alguns personagens da mesma. Claro, a carisma com o protagonista é natural, mas todos os personagens são minimamente desenvolvidos, possuem suas motivações bem definidas e alguns possuem até as próprias frases de efeito (e tenho dito).

 

A série é perfeita?

Obviamente não. Vamos ao principal defeito da série na minha visão: a trilha sonora. E não, com isso eu não acho que ela teria que ser orquestrada em Londres por John Williams, longe disso. Entretanto, eu esperava que o resto da trilha sonora da série tivesse a mesma atmosfera da música tema, mas o que de fato é oferecido é muito mais um som ambiente ou uma música de circo, poderia melhorar um pouco neste aspecto. Houve algumas reclamações do diálogo também, mas definitivamente não de minha parte, pra ser honesto. Vi muitos dizerem que os diálogos são tão rasos quanto os de George Lucas, um ponto até válido se considerarmos que Jon Favreau, o cabeça por trás do roteiro da série, estudou bastante a visão de roteiro do criador de Guerra nas Estrelas. Os diálogos de fato não envolvem lá muita complexidade, mas não vejo isso como um problema, acho até que adequa-se bem ao que se diz a dinâmica da série.

Vi também alguma crítica sobre os episódios serem muito independentes um dos outros, o que eu considero uma crítica demasiadamente válida, porém discordo novamente que isto seja um problema de The Mandalorian. Essa “independência” é válida dentro do contexto que a série se insere, até porque no fim das contas, o protagonista é um caçador de recompensas. E, pelo que eu saiba, caças possuem ciclos que podem (e devem) ser fechados em episódios, até para manter um bom ritmo dentro da série. Por isso, eu diria que o grande erro da série (falando aqui sem spoilers, pois achei 2 erros bem específicos no último episódio que são basicamente spoilers) é a trilha sonora em grande parte mediana.

VEREDITO



 The Mandalorian é tudo aquilo que Star Wars precisava; possui ritmo e um excelente desenvolvimento de personagens (que, aliás, são pra lá de carismáticos). É de uma ambientação pra lá de “faroéstica”, mas também é marcada por elementos clássicos da saga de Guerra nas Estrelas, com um tom mais escrachado visualmente no que se diz ao antigo Império. Os diálogos são de fato simples, mas ainda com um charme de obra George Lucas que só poderia ser emulado por Favreau, já a direção (felizmente) passa longe de soar algo George Lucas, com as referências carimbadas de Jon Favreau estando ali presentes.

Por tudo isso (e mais um pouco), recomendo que quem não é fã de Star Wars assista, mas quem é fã de Star Wars eu recomendo ainda mais. As referências e o fanservice são na medida certa. Apesar da história ser bem fechada na primeira temporada, mais pode ser explorado daquele universo de forma sólida e não-forçada. 


PONTOS POSITIVOS:

  • Ambientação intensa;
  • Construção excelente de personagens;
  • Ritmo dos episódios e direção impecáveis;
  • Fan service na medida certa;
  • Diálogos simples, mas bem-elaborados e dinâmicos ao ritmo da série.

PONTOS NEGATIVOS:

  • Trilha sonora original poderia ser melhor.

The Mandalorian (1° temporada - Disney+)
Nota: 95/100
 Uma história Star Wars em sua melhor versão possível.

A segunda temporada de The Mandalorian estará disponível exclusivamente no Disney+ no dia 30 de outubro. Entretanto a chegada do serviço no Brasil (e na América Latina como um todo) está marcada para o dia 17 de novembro. Devido ao formato de lançamento de novos episódios semanais (toda sexta-feira, mais especificamente), o Disney Plus desembarca ao Brasil já com 3 episódios da nova temporada (lançados originalmente nos dias 30 de outubro, 6 de novembro e 13 de novembro), com os episódios lançados posteriormente já chegando simultaneamente aqui no Brasil e no resto do mundo.